A reforma tributária, possível e necessária

Estrutura atual é inadequada para o País crescer, criar empregos e estimular o empresário a investir. Leia a coluna de Luiz Carlos Trabuco Cappi publicada no Estadão.

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Entre os que se preocupam com a economia, é unanimidade a necessidade de uma reforma tributária.

Aumentaria o bem estar social e a taxa de crescimento do País, além de livrá-lo de um sistema desconexo, confuso e socialmente injusto.

Foi boa, portanto, a iniciativa do governo de enviar ao Congresso sua primeira proposta de reforma dos tributos, que deve ser seguida de outras três, e se soma aos projetos que tramitam na Câmara e no Senado.

A discussão será interessante. Os que carregam os custos de uma reforma não são os mesmos que auferem seus benefícios.

Esse debate não pode ficar para depois.

A pandemia de Covid-19 agravou o fato de que a estrutura tributária atual é inadequada para o País crescer, criar empregos e estimular o empresário a investir.

É a mesma há mais de meio século, com alguns ajustes na Constituição de 1988. Desde então, o Brasil se transformou.

É mais urbano, com outra matriz produtiva e maior demanda de recursos nas três esferas de governo.

O sistema se deformou nas últimas três décadas.

Aos sinais de dificuldades fiscais, os diferentes governos criaram “contribuições” ajustadas à maior demanda de recursos, o que formou um dos sistemas tributários mais complexos do mundo.

A modernização da economia e os produtos e serviços com inovação tecnológica também criam necessidades de nova classificação tributária. Há uma situação de potencial litígio entre cidadãos, empresas e o Fisco.

A autonomia dos Estados e municípios – com suas jurisdições e, dentro de limites, as alíquotas dos seus impostos –, foi pensada para fortalecê-los, porém, provoca disputas fiscais que enfraquecem a todos.

A estrutura tributária é regressiva, a alíquota efetiva para os mais ricos não é proporcionalmente maior do que para os mais pobres.

No Brasil, a concentração de renda elevada deve aumentar com a crise.

De novo, essa iniquidade pode ser atenuada por um sistema mais justo e equilibrado.

A situação fiscal já era problemática antes da pandemia.

Desde 2014, o setor público federal apresenta um déficit primário, que tem se expandido nos últimos meses.

A situação de muitos Estados e municípios é crítica.

Atualmente, há ainda dois projetos de reforma tributária, a PEC 110 e a PEC 45, que tramitam no Senado e na Câmara de Deputados.

São parecidos, unificam alguns impostos, mudam a sistemática de arrecadação e resolvem algumas distorções, não todas.

Buscam acomodar os interesses dos entes subnacionais.

A primeira parte do projeto de reforma tributária do Executivo unifica impostos federais e simplifica a arrecadação.

É complementar aos dois projetos em tramitação no Congresso Nacional.

A combinação dos três pode resultar numa reforma que atenda exigências de governadores e prefeitos. Ser o avanço possível.

O ideal é um novo sistema tributário acompanhado de mais flexibilidade orçamentária para alocar recursos e amortizar a dívida pública, para aumentar a eficiência da economia e induzir o investimento.

Uma construção focada no bem estar do Brasil, mais do que em proteger direitos adquiridos.

Estamos numa emergência tributária, para a qual todos precisam dar sua parcela de contribuição adicional.

Não há heresia, desde que em caráter temporário, com data para começar e para acabar, com o objetivo de achatar a dívida pública e evitar a insolvência do País.

O Brasil já superou crises fortes no passado.

Foi o que aconteceu em 1929 e nos anos 1960. Nas duas ocasiões, o sistema tributário foi substituído.

Foram criados e eliminados impostos, e a repartição de receitas foi alterada.

Os problemas foram superados e o crescimento nacional foi maior do que o mundial.

Podemos fazer o mesmo agora.

O ambiente é de convergência: o governo quer, o Congresso é reformista, enquanto empresários e trabalhadores apoiam lideranças comprometidas com o tema.

Entre tantas outras, a questão tributária precisa ocupar o topo da lista de prioridades.

Texto publicado originalmente em O Estado de S. Paulo (03/08/2020).

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