As grandes crises aceleram a história

O momento é oportuno para que iniciemos um debate sobre as lições que a pandemia nos trouxe e sobre o que devemos esperar dessa nova fase histórica. Leia a coluna de Luiz Carlos Trabuco Cappi publicada no Estadão.

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De uma coisa já se pode ter certeza neste momento tão marcado pelas dúvidas e pela angústia: passada ou amenizada a pandemia da covid-19, o mundo não será mais aquele que conhecemos até recentemente.

Muita coisa já está mudando ou vai mudar, e em praticamente todos os terrenos da atividade humana.

Na economia, na pesquisa científica, nas relações interpessoais, nas formas de comunicação, na educação, na avaliação dos governos, nas prioridades sociais.

É bastante provável que alguma coisa mude também no campo dos valores, isto é, naqueles princípios que as pessoas elegem como bons e necessários para a condução da vida.

Grandes crises, como se sabe, têm o predicado de acelerar a história, e com esta não será diferente.

O momento, portanto, é oportuno para que iniciemos um debate sobre as lições que a pandemia nos trouxe e sobre o que devemos esperar dessa nova fase histórica.

Como corrigir erros antigos e nos adaptar com eficiência a esse novo tempo.

Como aproveitar as alternativas positivas para melhorar a qualidade de vida, os laços familiares, a coesão social e fortalecer nossas instituições para que possamos enfrentar os novos desafios?

É uma discussão necessária, pois teremos de escolher novos caminhos, e em breve.

Não devemos perder tempo.

Começo com este texto uma contribuição periódica com o jornal O Estado de S. Paulo.

Trata-se de uma satisfação e um privilégio pelos quais desde já agradeço.

A crise provocada por um vírus até então desconhecido pelos pesquisadores, e para o qual ainda se busca um tratamento eficaz, foi inesperada, veloz em sua expansão, e de abrangência global.

Do ponto de vista da saúde, não sabemos ainda como ela vai progredir, pois mesmo os países que já obtiveram algum sucesso nas medidas de isolamento social temem uma segunda ou terceira onda de contágio.

Este é o aspecto mais dramático da pandemia, mas há outras consequências importantes, e entre elas o problema econômico.

Aqui também temos de lidar com estimativas e avaliações preliminares, mas elas nos dão uma ideia dos desafios que teremos de enfrentar.

Instituições, analistas e entidades preveem quedas históricas para o PIB, só comparáveis ou até superiores à da Grande Depressão dos anos 1930.

Há preocupações correlatas, como o aumento do desemprego, o agravamento do protecionismo, a redução do comércio entre os países e a queda do investimento estrangeiro.

No Brasil, estima-se uma queda desoladora do PIB em 2020.

O impacto no emprego já se vê. Somente em abril, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), a perda de empregos formais alcançou 860 mil vagas.

Para o setor público, o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, estima déficit primário de RS$ 700 bilhões em 2020.

Lembremos que no início do ano o déficit previsto era de R$ 124 bilhões.

O caso é que crises como esta já ocorreram no século XX, foram superadas e delas resultaram coisas boas.

Foi assim na Grande Depressão americana, que se estendeu por boa parte da década de 1930.

A própria reconstrução dos países europeus após a Segunda Guerra Mundial nos dá outro exemplo.

Mesmo num momento tão desafiador como o atual, o Brasil está encontrando suas soluções.

Nosso sistema político, apesar de todas as fricções e tensões, confirma-se robusto o suficiente para dar respostas rápidas às necessidades sociais dessa emergência.

O nosso Estado democrático é uma âncora fundamental para o desenvolvimento econômico, a estabilidade macroeconômica e a confiança dos investidores estrangeiros.

O isolamento fez com que praticamente a totalidade das empresas tivesse de se reinventar ou rever as suas táticas e estratégias.

Há muitos relatos de ganhos de produtividade nos mais diferentes setores.

Os canais digitais se consolidam como pontes abertas para o futuro.

As compras pela internet avançam no comércio em alta velocidade.

Os clientes dos bancos incrementam seu relacionamento pelos canais digitais.

O home office, a educação à distância e as teleconferências, como se vê, vieram para ficar.

Esse já é o novo mundo.

Ganhos de eficiência em todas as atividades serão o caminho para se alcançar a porta de saída da crise.

Quanto mais as pessoas e as companhias firmarem compromisso com o fazer melhor, e com empatia ao próximo, estaremos posicionados para os espaços que serão reabertos na tão desejada volta, em segurança, da economia.

Texto publicado originalmente em O Estado de São Paulo (08/06/2020).

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